quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Monólogo de Marcos Riverio com uma mulher

Não faria sexo consigo, já lhe disse, de modo nenhum faria sexo consigo. Não é que lhe queira mal, nem tampouco me enoja, não chega a tanto, será mais a indiferença estática que me faz dizer que não faria sexo consigo. Não vá embora, não quis intimidá-la, mas o que me está a fazer crer é que quer fazer sexo comigo, e que, como lhe digo, é algo a que não estou disposto neste momento… Não é que pense em qualquer outro momento em que pudesse fazer sexo consigo, para mais, quando se quer realmente fazer sexo com alguém, o que se imagina é sempre o tempo e o espaço menos próximo e, por vezes, adequado, para fazê-lo… e consigo não quero mais que esta pequena conversa que estamos a ter. Sim, eu sei que não pediu, mas isso não são coisas que se peçam. Não, não é a minha opinião, não são coisas que se peçam, claro que pode ser pedido, e não é difícil formular os pedidos, mas não esperaria de si que fosse daquelas pessoas que formulam esses pedidos. Não, vergonha não é a palavra comum que se usa por aí cada vez que ficamos com a cara vermelha sem beber, é a vergonha como um conjunto de actos que tomamos para fazer valer os nossos desejos, e é um belíssimo conceito para se aplicar àquilo que nós queremos. Não, é concerteza um elogio, qual é o espanto, não compreendo, não quero fazer amor consigo mas quero elogiá-la e dizer-lhe que está uma belíssima noite. Não preciso fazer amor consigo, tenho outras com quem quero ter sexo, mais que consigo, não querendo dizer que eu esteja a escalonar e seleccionar as pessoas, só não acho que devamos fazer sexo, como a menina acha. Vê, aí está a sua reacção, está envergonhada porque insistiu em algo que não deveria insistir. Talvez devesse insistir, porque sabe que não acedo ao seu desejo, insistir seria idêntica à satisfação que teria a fazer sexo comigo, pense nisso. A dialética não existe só nos textos, também faz parte do sexo, suspeito mesmo que nasça do sexo, coincidência engraçada pois nós mesmos nascemos graças ao sexo, talvez tudo quando exista venha do sexo de uma forma ou de outra, mas isso seria assumir que nós, humanos, somos o centro do mundo. E não somos, o sexo é que pode ser o centro do mundo. E a virtude está no centro, ou será no meio? O meio pode não ser o centro, quer dizer, pode ser o centro e o meio ao mesmo tempo, mas será sempre centro e meio ao mesmo tempo todo o sempre? Algo estar no meio implica que haja algo à sua volta que não seja a mesma coisa que está no meio, há algo divisível do meio que não é mesmo que o que está no meio. Já o centro pode ser o mesmo que o que o envolve e não está no meio. O centro de uma bola é, sem dúvida, o centro, mas o que está à sua volta não é, nem podia ser, outra coisa que não a bola. Podemos dizer: aquela bola está no meio daquelas folhas. Não podemos dizer: aquela bola está no centro daquelas folhas. Ou seja: o meio implica uma distinção mínima do que o torna meio e periferia; o centro implica uma inclusão máxima do que é central e o que é periférico ao seu centro. Acho que isto serve muito bem de explicação quando digo que o sexo é o centro do mundo, mas pode não ser a virtude, porque não é o meio, é o centro do mundo que incorporamos como mundo em nós. Mas não é o meio de nada, não irradia para além do desconhecido e do futuro. Isso, talvez, seja o amor, e olhe que talvez implica que desconheça. É uma pista. Além do mais, se fizesse sexo consigo saberia, certamente, que não sinto amor por si. Agora, se a amasse, estaria neste momento em cima de si, não estariamos aqui com estas conversas visto que já a conheço faz hoje dois anos e não sei quantos meses. Já devia saber que eu tenho coisas destas e não devia fazer essa cara, que agora já não é de vergonha, mas também não é de espanto, é de… Não fique assim, como se perdesse o assunto, fale comigo sobre outras coisas.

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